Sobre Winnicott

Winnicott é um dos poucos psicanalistas que contribuíram com idéias originais. Chegou à Psicanálise a partir da Pediatria. Sua obra, tanto a teórica como a clínica, não se insere somente no campo pediátrico e psicanalítico. Ele teve a preocupação de escrever para profissionais de Educação, Assistência Social , Pediatria , Saúde Mental e também para os pais.
Seguiu os postulados de Freud e de M. Klein, ainda que se tenha separado desta última a partir de diferenças radicais na teoria. Todos os grandes conceitos winnicottianos, construídos a partir de 1945, fazem parte de um sistema de pensamento fundado na noção de relação: a mãe devotada comum, a mãe suficientemente boa, o jogo da espátula ou do rabisco ou ainda o falso e o verdadeiro self e o objeto transicional.
Winnicott deu primazia à evolução psíquica do ser humano durante a fase de dependência absoluta. Ele diz que nos primeiros seis meses de vida, aproximadamente, o bebê acha-se num estado de dependência do meio que é representado pela mãe ou por outra pessoa que exerça essa função. O bebê não tem conhecimento de seu estado de dependência e na sua mente ele e o meio são uma só coisa.
Winnicott tentou explicar como o indivíduo cresce, a partir da dependência absoluta, para uma forma de ser pessoal. Como de acordo com a sensação que tem o indivíduo de si mesmo, se converte numa pessoa comum e caracteristicamente única ao mesmo tempo, que o ambiente torna possível e facilita, no melhor dos casos.
Isto só será possível se o bebê tiver uma “mãe suficientemente boa” para oferecer-lhe uma adaptação ativa no início. Desta forma, ela evita submeter o bebê a situações além da sua capacidade de dar conta. Oferece fragmentos tão simplificados do mundo quanto é capaz de assimilar. Ao mesmo tempo, assegura condições ao bebê de ter, com o passar dos dias, uma vivência de continuar a existir, uma linha de vida dando condições ao bebê de sair desse estado rudimentar para um mais integrado.
Winnicott postulou que a mãe é quem apresenta o mundo à criança, mas em dose que a criança possa tomar, de tal maneira que o traumático termina sendo aquilo que a criança não pode compreender, ou não pode encontrar- lhe um sentido.
Na segunda fase da vida , aproximadamente dos 6 meses aos 2 anos, a criança pequena entra na fase de dependência relativa da mãe e dos substitutos parentais. Chama-se dependência relativa porque a criança se conscientiza de sua sujeição e, por conseguinte, tolera melhor as falhas da mãe, assim tornando- se capaz de tirar proveito delas para desenvolver- se.
Winnicott pronunciou uma famosa frase em 1964, dizendo que o “bebê não existe”. Ele queria dizer com isso que o bebê nunca existe por si só, mas sempre essencialmente como parte de uma relação. Se a mãe estiver incapaz, ausente ou, pelo contrário, demasiadamente intrusiva, a criança se arrisca à depressão ou à conduta anti-social como o roubo ou a mentira, que são maneiras de reencontrar, por compensação, uma “mãe suficientemente boa”.
Um dos conceitos fundamentais na obra de Winnicott é o conceito de Self. De difícil definição, refere-se a algo essencial de uma pessoa e está unido à sua vitalidade, a partir do emprego de suas tendências inatas. A adaptação precoce ao meio foi um dos perigos percebidos por Winnicott em relação ao self, que poderia vir a ser um passo para a constituição de um Falso Self. É fato que todo organismo tem que se adaptar ao meio, mas também deve saber diferenciar-se como modo de aumentar suas probabilidades de sobreviver. A mãe deve fornecer o necessário ao bebê e desta forma satisfazer todas as suas necessidades. Assim, o bebê poderá adaptar-se à realidade externa, apresentada gradualmente, devendo a mãe colocar limites a essa disponibilidade total, reduzindo-a aos poucos .
Outro conceito importante na obra de Winnicott diz respeito aos objetos e fenômenos transicionais. O autor denominou esta área de “espaço de ilusão”, onde a criança desenvolve atividades que são denominadas fenômenos transicionais; podem ou não incluir um objeto. Estas atividades só se tornam possíveis se houver maternagem suficientemente boa na fase crítica primitiva que possibilite uma continuidade no tempo emocional externo. Assim, o espaço transicional se constitui nesta área intermediária que propicia o alívio da tensão de relacionar a realidade interna com a externa. No decorrer desta fase a mãe suficientemente boa é aquela que sobrevive aos ataques agressivos da criança, possibilitando que esta faça um trabalho de reparação e restauração da mãe.
“ O melhor que uma mulher real pode fazer pelo filho é ser , no começo,suficientemente boa em termos sensíveis, de tal modo que, desde o início a criança possa ter a ilusão de que essa mãe suficientemente boa é o seio bom”. (Winnicott,1990)
Para que a criança possa penetrar no mundo e começar a tomar distância da mãe, precisa ter algo que lhe permita neutralizar o efeito paralisante e depressivo que significam as separações da mãe. O objeto transicional cumpre a função de controlar as ansiedades que lhe produz a separação da mãe. Neste espaço, a contribuição da criança e da mãe se torna possível através de um objeto ao qual se afeiçoa e que lhe serve de companhia ao ir dormir ou quando se sente ameaçada de perda; significa tanto a mãe que se ausenta quanto aquilo que dela permanece.
Assim, é esta condição de abertura, da possibilidade de contribuir com seu gesto e aceitar e acolher o gesto do outro, que se vai constituir o espaço do brincar. A esta condição Winnicott chama de um espaço potencial e é na sua constituição que se torna o brincar possível. Para Winnicott, o brincar é que é a terapia fundamental. Se a criança não tem condição de brincar, temos de capacitá-la para isso.
Entre as inovações técnicas de Winnicott figura a técnica do Jogo do Rabisco. O procedimento consistia em propor à criança uma brincadeira: começar a traçar um rabisco em um papel para que esta o completasse como quisesse, para em seguida inverter o processo. Esta técnica era usada para estabelecimento da comunicação emocional não-verbal com a criança. O prioritário é o brincar e desempenhar o papel que a criança necessita num dado momento tão crucial quanto da interpretação de suas angústias, conflitos e processos.
Quanto à agressividade, o autor em 1950, afirmou que “a agressividade é quase sinônimo de atividade. A agressão faz parte da expressão primitiva do amor”. Portanto, a agressividade é também considerada um produto da relação do indivíduo com o mundo externo.

Não se pode deixar de pontuar que a preocupação de Winnicott não era a inovação de técnicas e conceitos psicanalíticos, e sim a formulação e discussão de idéias que se originaram no seu trabalho clínico durante a sua experiência profissional. É inegável que, em seus escritos, a sua grande preocupação era com a realização integral do ser humano, que não pode ser afastada do ambiente de que o indivíduo faz parte. Para Winnicott a subjetividade é constituída não só pelo mundo interno, mas também pelo ambiente. Assim, oferecia aos seus analisandos um “ambiente especial”.